segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Reportagem sobre inclusão na cidade de São Borja

oioi, pessoal. hoje venho publicar a reportagem de um amigo formando em jornalismo, Eduardo Vieira da Silva, que fala sobre a inclusão das pessoas com deficiencia na cidade de São Borja. eu achei superinteressante, e re

Universidade Federal do Pampa
Campus São Borja
Curso de Comunicação Social, habilitação em Jornalismo

















Eduardo Vieira da Silva



PRODUTO
GRANDE REPORTAGEM






















São Borja/RS
Novembro de 2010

Jornalismo Cívico: Educação Inclusiva em escolas municipais de São Borja.


O que busca a inclusão

“Todos temos direito a ser iguais quando a diferença nos diminui e todos temos direito a ser diferentes quando a igualdade nos descaracteriza”. A frase do sociólogo português Boaventura Sousa Santos poderia servir como síntese do que a educação inclusiva se propõe a implementar. Através desse processo de educação surgido nos anos 70 nos Estados Unidos, alunos portadores de necessidades educacionais especiais (NEE) têm o direito de freqüentar a escola regular, tendo a possibilidade de conviver com os colegas que não possuem deficiência. As barreiras concretas e abstratas devem ser removidas e a diversidade enaltecida. Falar sobre inclusão é falar sobre direitos humanos.
A expressão “educação inclusiva” ao invés de “escola inclusiva” não é por acaso. Para os teóricos desse movimento, o termo escola centralizaria o dever da inclusão na instituição de ensino, ao passo que a palavra educação compreende toda a comunidade escolar: escola, pais, poder público em geral. O fim último da inclusão não é apenas promover a educação para todos, e sim construir, através da inclusão social, uma sociedade para todos.

Legislação inclusiva

Em 1994 os países que compõe a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco, na sigla em inglês) assinaram a Declaração de Salamanca na Espanha, em que se comprometiam a incluir os alunos na escola regular.
O Brasil, além de signatário do documento da Unesco, determina os direitos dos alunos com NEE desde a Constituição de 1988, seguida do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) de 1990 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). Já em 1999 são criados a Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência e o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência, o Conar. Em 2000 as escolas iniciam o processo para incluir os alunos com NEE. Após a Convenção da Guatemala, em 2001, é assinado pelo governo brasileiro decreto que determina que os alunos especiais devem ter o mesmo acesso ao ensino fundamental que os demais.
Em 2003, a Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação (MEC) criou o Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade. De acordo com o site do MEC, o programa “forma gestores e educadores para o desenvolvimento de sistemas educacionais inclusivos”.


Como anda a inclusão em uma cidade pólo em educação especial

São Borja, cidade em que está enterrado o corpo do ex-governador Leonel Brizola, um entusiasta da educação, é uma das 144 cidades pólo em educação especial no Brasil. O pólo atendido pelo município engloba outras trezes cidades da região. O objetivo é formar e capacitar professores e gestores na área da educação inclusiva. Pela designação, São Borja tem a responsabilidade de coordenar a Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva no pólo regional. Os recursos financeiros para a formação desses profissionais são providos pelo Governo Federal.
Para a secretária municipal de Educação e Cultura, Ana Cláudia Gattiboni Dutra, as escolas municipais da cidade estão preparadas para receber os alunos com NEE (ver entrevista na página ao lado). Ana Cláudia diz que a secretaria tem recebido os materiais do Ministério da Educação (MEC) e que a prefeitura está se empenhando no tema. Afirma, ainda, que sempre se tem o que melhorar, como banheiros que precisam ser adaptados.

Enquanto isso, na sala de recursos...

Aos alunos especiais é ofertado em sua própria escola ou em outra instituição de ensino o Atendimento Educacional Especializado (AEE). Com recursos do Fundo de Manutenção da Educação Básica (Fundeb), geridos pelo poder público municipal, as escolas inclusivas dispõem de uma sala de recursos multifuncionais, equipada com computadores, brinquedos e outros materiais pedagógicos.
O aluno portador de NEE realiza as atividades no turno inverso ao das aulas. O tempo médio é de 45 minutos. Os professores determinam quantos dias por semana o aluno receberá o atendimento e se este será feito de forma individual ou em pequenos grupos de dois ou três estudantes. Quando o aluno não consegue fazer uma prova na sala comum a avaliação pode ser feito na sala de recursos.
Cada aluno tem um Plano de AEE elaborado conjuntamente pelos professores das salas de recursos e comum. O plano, que pode contar com a participação dos pais do aluno, deve ser adequado à realidade de cada estudante.

Silvana: estimulação precoce dá resultados

Os profissionais da área da educação especial destacam a importância da estimulação precoce para os deficientes. É o caso da aluna da Escola Ubaldo Sorrilha da Costa, Silvana Damaceno, portadora de síndrome de down que aos sete anos de idade consegue, à sua maneira e dentro das suas possibilidades, ter uma rotina de aula praticamente normal a de seus colegas do segundo ano do ensino fundamental.
Ela se senta próxima à mesa da professora Adriana Andrade e vai rabiscando um desenho no caderno, enquanto os colegas realizam a tarefa exposta no quadro. Está tentando aprender a letra “A”, inicial do nome da professora. O objetivo é associar o alfabeto ao nome das suas professoras e aprende-lo por completo até o final do ano.
- “O que ela aprendeu na semana anterior, esquece na seguinte. Sempre se tem que retomar. O desenho é para acompanhar os outros colegas”, explica Adriana.
De acordo com a professora, a estudante já apresentou evolução, porque anteriormente fugia da sala e não segurava o lápis corretamente. Kátia Damaceno, mãe da aluna, também percebe o desenvolvimento de Silvana. Antes de freqüentar a escola comum, a menina estudou na Apae. Aos três anos entrou para a Escola Municipal de Educação Infantil América Teixeira em São Borja.
“– Antes ela tirava a língua para fora, não queria sentar direito, queria comer com as mãos. Na escolinha (América Teixeira), aos três anos, a convivência social dela progrediu bastante. Ela sabia o que tinha que fazer”. Na atual escola, conta a mãe, ela conseguiu desenvolver a fala, algo não atingido até os cinco anos de idade. Nas brincadeiras com as crianças, aprendeu a socializar-se.
A síndrome de down afetou Silvana, sobretudo, na fala. Ela necessita de atendimento fonoaudiológico, mas Kátia diz que não consegue vaga para o tratamento.
Além das aulas regulares, Silvana faz atividades na sala de recursos no turno inverso de suas aulas. A professora Alzira Carvalho, que atende na sala alunos deficientes da própria escola e de outra instituição estadual de ensino da cidade, define Silvana como “uma aluna bem espontânea”, pois tem iniciativa e interage com os colegas.
Sobre a inclusão, Kátia não tem dúvidas: “– Eu sou a favor. Eu quero ver ela (Silvana) progredir, ela não é diferente. A única diferença é não falar, ter o olhinho puxado, fora isso, não tem diferença”.

Joseane: dúvidas sobre a inclusão

“Não sei, vou ver”, afirma Sara Robalo, mãe de Joseane, 13 anos, aluna portadora de síndrome de down da Escola Ubaldo Sorrilha da Costa, respondendo sobre a continuação da filha na escola comum. Sara diz que pensou em “experimentar” a ideia de Joseane estudar na escola “para ver se melhorava”, após retirar a menina da Apae. A conclusão ela vai fazer no final do ano letivo. Além da síndrome de down, a jovem também tem problemas de pressão cardíaca e encontra dificuldade para caminhar sozinha.
Esta é a primeira vez que Joseane está incluída em uma escola comum. Apesar do ceticismo, Sara notou avanços:
“- Quando ela entrou aqui ficou mais alegre. Em casa ela tem mais disponibilidade para brincar, se liberou mais”.
Segundo Sara, uma psicóloga que atendeu Joseane disse que o jeito reservado e de pouca iniciativa é devido ao temperamento da menina. Recomendou que se respeitasse essa característica.
Em sala de aula, a professora Cecília Saueressig procura incluir Joseane em todas as atividades. Logo no início do dia, na hora do conto, a menina “lê” para seus colegas uma história, fazendo gestos com a boca, tentando balbuciar algumas palavras, enquanto mostra as figuras do livro para a turma. As crianças estão sentadas em circulo, junto com a professora, que ao lado de Jô vai incentivando a menina a falar.
Enquanto a diretora da escola, Nadir Carvalho, entra na sala e cumprimenta os alunos, Jô ri sozinha, dentro de seu mundo particular. Afora isso, permanece silente, com o olhar vago. A diretora se retira, Cecília escreve no quadro as atividades do dia, pede a participação da menina, mas é necessário que a professora a conduza em direção ao quadro. Jô faz os seus traços no quadro.
Posteriormente, a tarefa da turma é pintar um soldado, desenhado em uma folha, já que aquele era o Dia do Soldado. Joseane utiliza diversas cores em sua pintura e sabe identificar a maioria delas. Segundo a professora, para essa atividade a aluna é independente.
“- Às vezes deixo ela sozinha um pouco para atender os outros alunos, mas mesmo assim sempre estou ‘puxando’ ela”, ressalta Cecília.
Por fim, após tentativas da professora, Jô consegue dizer o seu nome, o da professora e o meu. Ela comprova que, respeitado o seu tempo, consegue realizar a tarefa solicitada.

Geovana: acessibilidade para uma cadeirante

Na aula de história da turma do quinto ano da Escola Francisco Miranda, a professora Maristela Santos pergunta:
“- Quem vai ajudar a Geovana?”
“ – Eu!”, responde a turma, em uníssono.
Todos os alunos querem ajudar a colega Geovana Bastos, 16 anos, portadora de deficiência múltipla, causada por uma lesão cerebral que afetou tanto intelectual quanto fisicamente a jovem. Geovana é cadeirante, mas conta com a ajuda dos colegas para entrar na sala e copiar os temas de aula. Por só conseguir ler palavras simples e não saber escrever, a professora ou um colega copia o material no caderno da estudante.
Para Rosângela Trindade, o retorno oral da jovem é bom:
“ – Ela fez uma prova de português, na sala de recursos, em que a gente leu o texto para ela e fez as perguntas. Ela deu todas as respostas e foi bem”, lembra Rosângela, salientando que o professor deve saber até onde o seu aluno pode chegar.
Em casa, conforme relata a mãe da estudante, Elaine Bastos, Geovana consegue se locomover com o apoio de um andador e tenta desempenhar afazeres domésticos.
“ - Ela tenta lavar a louça, vai na pia da cozinha, mas eu tenho medo que ela vá cair”, afirma Elaine. Geovana demonstra ter o desejo de aprender a fazer as tarefas.
No turno inverso ao da escola, uma vez por semana, realiza tratamento de equoterapia – método terapêutico e educacional que utiliza a equitação - na Apae de São Borja. Pela vontade de Elaine, sua filha continuaria na Apae, pois considera que o número reduzido de alunos por sala torna o atendimento melhor que o da escola comum.
O histórico escolar da jovem é de ter estudado até os onze anos na Apae de São Borja. Há cinco anos está incluída na escola comum.
A orientadora acredita que o mais importante é que a estudante sabe responder o que lhe for perguntando a respeito dos conteúdos, e que a exigência de saber ler e escrever vem da sociedade.

Geiso: incluído na escola pioneira

Aos 17 anos, com cerca de 1,80 cm de altura, Geiso Turba chama a atenção na turma do quarto ano do ensino fundamental da Escola Vicente Goulart. Seus colegas são menores, como se fossem irmãos mais novos. No início tinham certo receio do colega, mas depois a socialização se tornou plena. Geiso é portador de deficiência mental, característica que não impediu o jovem de interagir com os colegas.
Na aula da professora Angelita Pereira ele está sempre resolvendo alguma tarefa, normalmente pintando desenhos que copiou do caderno dos colegas. De acordo com Angelita, essa foi uma maneira de aproximar o aluno do restante da turma, que está sempre disposta a ajudá-lo. Geiso também está sempre disposto a emprestar os seus materiais para as outras crianças, como lápis de cor. O quadro-negro é dividido em duas partes: do lado esquerdo, a atividade de Geiso; do lado direito, a dos demais.
Mas não é só por desenhos que é composta a rotina pedagógica do jovem. A professora conta que ele está aprendendo a escrever algumas palavras. No momento da educação física o acesso também está garantido. Existe uma rampa que leva até a parte de trás da escola, onde está localizada a quadra de esportes. Geiso hoje está jogando futebol. Como medida de segurança, ele não vai até a quadra para não se machucar, já que também encontrar dificuldades para caminhar, praticando a atividade do lado de fora da quadra. No turno inverso da escola freqüente a Apae para receber atendimento de fisioterapia.
De volta à sala, levanta-se reiteradamente para mostrar à professora o que está fazendo. Demonstra curiosidade pelo material que carrego: bloco de notas e mp4. Quer saber do que se trata, para que serve. Depois, pede para que eu faça um desenho em seu caderno para colorir.
A escola de Geiso é pioneira em educação especial na cidade. Nos anos 90, um grupo de professoras da escola Vicente Goulart teve a iniciativa de ofertar vagas na escola para deficientes auditivos, dando início ao processo inclusivo no município. Os alunos tinham aula nas classes especiais, como eram chamadas à época. Em seguida, outras instituições municipais de ensino de São Borja também ofereceram o atendimento como uma extensão do trabalho que era prestado no Vicente Goulart. Atualmente as classes especiais foram abolidas de todas as instituições de ensino, mas a importância do trabalho iniciado pela escola dimensiona-se pelo ineditismo da ação.

Desafios da inclusão: com a palavra, os professores.

Com a autoridade de quem atua na área da educação há cerca de trinta anos, a professora Alzira Carvalho se preocupa com o futuro da inclusão nas escolas:
“ – Na teoria é muito bonito, mas na realidade é bem diferente. Foi implantado de cima para baixo. Primeiro deveria se capacitar os professores”. Alzira assinala que cada caso é um caso, não existindo fórmula pronta para a educação inclusiva.
A educadora explica que o conteúdo deve ser dado para os alunos comuns e, depois, de uma forma alternativa para que os alunos com deficiência não fiquem excluídos na turma. “É preciso se doar muito”, comenta. O professor, conclui, deve buscar métodos diferentes de aprendizagem e o trabalho deve ser feito em sintonia entre a sala comum e a sala de recursos.
Adriana Andrade afirma que se deve estimular as atividades complementares desenvolvidas na Apae ou em outra entidade, conforme já é feito por alunos, pois isso contribui com o processo inclusivo. Maristela Santos diz que dependendo da deficiência não é fácil cumprir os objetivos da inclusão, por exigir bastante do professor. Ressalta a necessidade da participação de todos, como os familiares. Carmem, professora de matemática da escola Francisco Miranda, diz que, dependendo da situação, não existem muitas opções para o ensino. Rosângela Trindade aponta a não aceitação do professor como obstáculo para a inclusão.
Recém formado em Letras por uma universidade da região, Mário Brandes confessa não se sentir preparado para educar os deficientes. Ao longo do curso, teve apenas uma disciplina, a de Língua Brasileira de Sinais (Libras), em que a educação especial era o foco dos estudos. No estágio em uma escola municipal de Itaqui trabalhou com uma aluna portadora de deficiência visual, encontrando dificuldades para o ensino.
“ - Tinha a vantagem de que ela é uma pessoa super independente e tem recursos materiais, como um notebook para a aula. Agora, se é alguém com deficiência que dependa mais de ti, uma criança por exemplo, e não tenha recursos materiais, é difícil. Tu não sabes o que vai fazer”, afirma.
comendo a leitura até o fim. bjs a todos!

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito bom trabalho no Brasil precisamos de profissionais iguais a estes que acreditam na igualdade